
Saudoso dos bons tempos do Brasil
nas pistas, andei assistindo algumas corridas de nossa época de ouro na F1. Até que cheguei ao GP do Japão de 1988, corrida em que Ayrton Senna
conquistou seu primeiro título.
Na época achei a corrida
fantástica, mas nada que não fosse esperado de Senna. Hoje, 24 anos depois,
parece que caiu a ficha: o que Senna fez nesta corrida foi quase sobrenatural.
Lembro-me que ele disse em uma entrevista com
Roberto Carlos (o cantor) que ele havia visualizado Deus naquela corrida. Virou
motivo de piada, mas acho que foi realmente Deus que operou aquele milagre.
Na temporada de 1988 a McLaren
tinha de longe o melhor carro, os melhores pilotos, o melhor motor e dinheiro
de sobra. Dominou em todas as pistas e venceu 15 de 16 corridas. Prost,
companheiro de Senna, era o então líder da equipe com a qual já havia
conquistado dois títulos mundiais. Senna ainda era tido como um piloto assustadoramente
rápido, mas inconstante. Havia feito 13 poles até ali, mas Prost o apertava na
tabela de pontos.
Senna, claro, largava na pole no
GP do Japão, com Prost em segundo. Quem vencesse seria o campeão da temporada.
Na largada Senna, nervoso, deixou o motor apagar. Chegou a levantar os braços
sinalizando o problema, mas, como a reta de Suzuka é em descida, o carro pegou
um embalinho e Senna conseguiu fazer pegar no tranco.
Quem vinha atrás teve que desviar
e por pouco Berger e Piquet não encheram sua traseira. Prost pulou na frente,
seguido de Berger de Ferrari e um surpreendente Ivan Capelli em terceiro com um
March (este foi o primeiro carro de sucesso de Adrian Newey, o mago das
pranchetas, atualmente na Red Bull). Senna caiu para 14º. Aí começou a maior
atuação de um piloto de F1 da era moderna. Na primeira volta ele passou seis
carros e fechou a primeira volta em oitavo. Infelizmente a TV Japonesa não
mostrou as ultrapassagens e até hoje fico curioso de saber como ele conseguiu
isto. Na segunda volta, já passou em
sexto. Duas voltas depois já era quarto. Aí começou a garoar. Só para melar a
pista e dar um pouco de chance para Senna, que já era o rei da chuva (será que
foi obra de Deus?). A diferença entre ele e Prost era de 16 segundos. Senna foi
tirando, tirando e chegou em Prost. Neste momento a pista secou e Prost, que só
andava bem no seco, conseguiu se manter à frente, mas aí Senna já estava ali fungando
no seu cangote.
Ok, seu carro era muito superior ao das outras equipes, mas descontar
uma diferença tão grande para seu companheiro de equipe, ninguém menos que
Alain Prost, foi algo mais que fantástico. Como manter um nível de concentração
tão alto e uma habilidade tão grande com a pista escorregadia, depois de
tamanho nervosismo com o erro na largada?
Outra característica de Senna era
sua imensa capacidade de se livrar dos retardatários. Ele quase passava por
cima deles. Já Prost ficava ensaiando o melhor lugar para passá-los. Foi numa
destas que Prost entrou na reta atrás de um retardatário. Senna embutiu no
seu vácuo, botou de lado e passou Prost, o retardatário e tudo o que mais tivesse
pela frente. Sua determinação foi tão grande que mesmo o Prost o empurrando
para fora da pista ele colocou duas rodas na grama e freou lá dentro. Deu uma
traseirada com o carro no meio da curva, controlou lindamente e se manteve na
ponta.
Quando cruzou a linha de chegada
estava nove segundos a frente de Prost. Ali todo o mundo da Formula 1 se rendeu
ao seu talento e o Brasil amanheceu em festa, como se a seleção de futebol tivesse
sido campeã. Confesso que fui às lágrimas, afinal, depois do erro na largada,
ninguém acreditaria em uma recuperação tão fantástica, mágica, quase
sobrenatural. Acho que não deveriam duvidar de que ele viu Deus naquela
corrida.
Senna não era imbatível e seus
erros mostravam que era sim um ser humano. Mas não houve jamais piloto tão
determinado, com uma força interior tão grande que o fazia realizar coisas
inacreditáveis.
Por isso, que me perdoem Alonso,
Schumacher, Vettel, Hamilton, Prost, Lauda, Fangio, Clark, Stewart e alguns
jornalistas especializados: ainda não apareceu ninguém melhor que o Magic Senna.
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